4 de janeiro de 2009

SOBREVIVÊNCIA – AS EMPRESAS ESTÃO PERCEBENDO OS VERDADEIROS INIMIGOS DOS SEUS OBJETIVOS?

A IMPORTÂNCIA DA REVISÃO FREQUENTE DOS OBJETIVOS E ESTRATÉGIAS

Passei recentemente por experiência interessante. Uma longa reunião, empresário forte, empresa forte, mas já sofrendo os efeitos da crise de liquidez que está apenas começando. Este empresário já tinha definido suas estratégias para 2009 e buscava mais recursos para a sustentação das mesmas.

Nesta discussão comecei a perceber que ele não fazia muita distinção entre o que são objetivos a buscar e estratégias que irá aplicar. Ao mesmo tempo, percebo que para um ano que deverá ser conturbado como 2009, ele já tinha tudo muito bem definido em termos de estratégia. Definido até demais!

Lembrando o mestre Jorge Hori (velho amigo especialista em análises de estratégias de governos), comecei inicialmente a questionar as diferenças que ele fazia entre objetivos e estratégias. Percebe-se então neste caso quão perigosa é a expressão “objetivos estratégicos”. Ela nos faz confundir objetivos e estratégias. No caso em questão, os objetivos não estavam nada claros. Se os objetivos não estão claros, como é que as estratégias podem estar claras, se elas apenas são encaminhamentos que realizamos para fazer acontecer os objetivos?

Ao mesmo tempo, outra questão: quais são as dificuldades que o nosso empresário terá que vencer para cumprir os objetivos? Quais são os inimigos dos objetivos da empresa? Lembrei então das palavras de Garrincha comentando a orientação do técnico Feola da seleção brasileira antes do jogo contra a Rússia na copa da Suécia: Os russos estão de acordo? O inimigo vai mesmo jogar da forma que imaginamos ou queremos que eles joguem?

Percebi então que em relação aos inimigos dos objetivos da empresa, o nosso empresário tinha ainda muita lição de casa para fazer - faltava ainda muita análise a ser feita. Verifica-se então que esta é uma situação comum a muitos empresários brasileiros. Estabelecemos os nossos objetivos e não olhamos muito para os inimigos que eles vão ter. Faz de conta que nossos objetivos não têm inimigos.

Voltando então ao mestre Jorge Hori, vem a questão chave: precisamos ter objetivos, devemos colocar os objetivos como referência da empresa toda. Congelamos os objetivos. Que estratégias vamos desenvolver e como aplicá-las?

Do ponto de vista militar, a estratégia vai depender dos objetivos, mas vai depender também dos inimigos dos nossos objetivos. Os inimigos não nos obedecem, não fazem acordos, não colaboram. Quem são os inimigos? A situação econômica, a recessão, os concorrentes, as alternativas de mercado, o custo Brasil e a corrupção, os importados, a falta de dinheiro e a falta de regras que caracteriza o estado brasileiro. Dá para congelar a estratégia e passar um ano seguindo o que foi combinado algum dia no passado como estava fazendo o nosso empresário? Não dá!

O que já sabemos de longa data é que precisamos congelar objetivos, mas não dá para congelar estratégias com a velocidade de transformação que está acontecendo nos cenários. É perigoso demais.

Já na década dos anos 80 era nossa recomendação substituir a prática do planejamento estratégico anual pela prática do debate mensal do raciocínio estratégico que é necessário para aquele momento da empresa. Por que essa mudança?
Lembro do tempo em que as siderúrgicas e as petroquímicas faziam planos para 20 anos. Vivi esta época. Depois passamos a fazer para 10 anos. Logo em seguida para 5 anos, 3 anos, 2 anos e me lembro de trabalhar em épocas altamente conturbadas, de inflação explodindo, orçamentos e planejamento estratégico para 6 meses. Era uma situação de loucura mesmo.

O que mudou nisso tudo? Simples, a velocidade dos acontecimentos. A velocidade com que os inimigos dos nossos objetivos mudam de comportamento, atitudes e as conseqüências que são geradas. Que conseqüências são essas?

Em outros tempos, o planejamento estratégico estabelecia posições a serem perseguidas. Hoje um dos fundamentos do raciocínio estratégico é a construção da condição competitiva da empresa para que ela consiga realmente os objetivos desejados, por ter força e competência para tal. Depois desta lição de casa bem feita, podemos estabelecer posições a serem perseguidas!

O que mais mudou? No passado se trabalhava com a análise das tendências de mercado e de como as empresas iriam se preparar para prosperar por conta destas tendências. Hoje o que trabalhamos é a análise das forças que estão em jogo, como estas forças podem ser anuladas ou bloqueadas e com que velocidade elas vão se manifestar e que surpresas elas vão nos apresentar. Analisamos o tempo todo, quais forças são amigas e quais são inimigas!

O jogo não é mais de quem é grande ou pequeno. Não é mais de quem está há mais tempo ou a menos tempo do mercado. De quem tem mais imagem de marca ou menos. O jogo hoje é de quem consegue ser mais rápido e consistente. Temos então mais um desdobramento. Rapidez e consistência pede muita sincronia na empresa. Questão já discutida em data recente.

Já de um bom tempo percebemos que o debate mensal tem algumas vantagens bem expressivas. A freqüência do debate nos ensina a pensar estrategicamente. Pensa estrategicamente quem consegue enxergar as forças amigas e forças inimigas e aprende a lidar com elas.

Quantas vezes nos damos conta que o planejamento estratégico estabelecido está puramente operacional, sem qualquer referência aos inimigos que estarão presentes no cenário? Se a empresa passa o ano todo no operacional, ao fazer o seu planejamento estratégico ela não consegue sair do operacional e ir para o estratégico. A empresa cumpre o formal do estratégico, mas o conteúdo é operacional e sem a riqueza necessária de que a empresa precisa.

Uma segunda vantagem. O debate mensal sincroniza as pessoas de uma forma que o debate anual não consegue fazer. Cria-se uma condição de convergência e diálogo por que se deu oportunidade ao debate.

Uma terceira vantagem expressiva vem de uma expressão lá do famoso MIT. Fazer estratégia é plantar, fazer o operacional é colher. Não se colhe o que não se plantou. A freqüência do debate estratégico nos trás então um plantio sistêmico de novas idéias, novos caminhos, novas soluções muito mais rico e bom para a empresa.

Percebemos então que vivemos uma nova vida. A vida da vigília competitiva de cada dia. A vida na qual o pensamento estratégico é necessário a cada instante e ele fica até mais importante do que o pensamento operacional. Vigília competitiva significa este estado de prontidão e de análise contínua das forças em jogo e a capacidade de acionar recursos e equipes a cada momento, a cada mudança da conjugação de forças.

Estamos então em tempos de uma nova gestão! É a gestão do equilíbrio da condução estratégica com a condução operacional. Ela é fator de sobrevivência e vitória. Parodiando os gladiadores no Coliseu de Roma, os que vão morrer te saúdam!


Luiz Bersou

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