7 de março de 2012

Qual o problema? Câmbio, competitividade ou velocidade?

O fenômeno China
Nunca me esqueço que na década dos anos 80 já se falava que um dia a China iria emergir. Seria um País que atuaria na indústria e metalurgia. Seria muito competitivo. Preços baixos. Falava-se também que o Brasil teria que acelerar sua pauta de exportação. Ocupar espaços internacionais antes do avanço da China. Vantagens do Brasil seriam a base industrial já instalada, matérias primas e a situação/promessa de fazer evoluir sua condição competitiva.

A resposta dos nossos governos foi o descaso com as políticas industriais e condição competitiva, cargas brutais de impostos, gerando a fuga de muitas empresas que na época deixaram o Brasil. Nunca me esqueço de ver produtos antes produzidos no Brasil, serem importados da Malásia! Os governos se preocuparam consigo mesmo e deixaram a condição competitiva da nação ao Deus dará.

Pouco foi feito na aceleração da pauta de exportação. Fora os grandes e tradicionais, não se desenvolveu o mercado de exportação para empresas menores, como é tão significativo em países como a França, Itália, Espanha, Alemanha e tantos outros países, em que a exportação é natural e do dia a dia dos seus empresários. Sempre me espanta o número extremamente pequeno de empresas brasileiras que exportam. O pior, muitas exportações “spot”, ocasionais.

Cadeias de Competitividade
Os que reclamam do câmbio esquecem o que chamamos de Cadeias de Competitividade. Uma empresa é competitiva se seus fornecedores são competitivos, se o sistema de infraestrutura onde ela se apoia é competitivo e se o Estado a quem ela paga impostos é competitivo. Se ela é competitiva e a soma de tudo isso mostra um quadro competitivo, então a Cadeia Competitiva em que a empresa está inserida é competitiva também. Aritmética simples.

Quanto mais eficaz for a Cadeia de Competitividade, menos importante é a questão do câmbio. Quanto menos eficaz for a Cadeia de Competitividade, mais importante será a questão do câmbio. Nossos governantes até hoje não aprenderam esse fundamento.

Portanto, a exemplo do que acontecia na época da inflação, que era um sintoma de um grave desarranjo interno, a questão do câmbio também é um sintoma de graves desarranjos internos. A única diferença é que aqui podemos colocar a culpa nos outros, tão a feitio de nossos governantes em poder que dominam o nosso país. Uma infelicidade.

Os ciclos da mentira
Observando o que acontece em outros países, os debates dos processos eleitorais que estão acontecendo em diversos lugares, em particular nos Estados Unidos, os graves problemas que vêm se manifestando desde a crise de 2008, tanto nos Estados Unidos como em toda a Europa, observamos que os fundamentos naturais que regeram naturalmente o sucesso e o fracasso dos ciclos econômicos ao longo de milhares de anos foram abandonados e vilipendiados. O resumo de tudo isso é que hoje a especulação vale mais do que o trabalho.

Como a especulação nem sempre funciona, dá trabalho cobrar os seus erros dos contribuintes, vivemos em um momento histórico no qual a versão do fato passa a ser muito mais importante do que o próprio fato em si. Quando nossos mercados naturais de exportação estão vivendo esses momentos e essas incertezas, reclamar do câmbio é apenas um grave sintoma de ingenuidade, ainda mais em se tratando de um problema que vai se alongar ainda por muito tempo. Lembro sempre que a bolha imobiliária que atrasou a economia do Japão já tem mais de 20 anos!

No caso brasileiro, dizer que câmbio é problema é querer pretextos para alongar os ciclos de ineficiência dos governos no trato da coisa pública, fugir do trato da condição competitiva do Estado, como base para a eficácia das Cadeias de Competitividade.

Capacidade de realização
Nunca me esqueço que na época do Pacto de Moncloa foi atribuída ao primeiro ministro de Espanha uma frase que me encantou. É fundamento de governança que o governo tenha mais velocidade do que a sociedade. Somente assim ele corre na frente e pode então preparar os caminhos que a sociedade irá percorrer.

Recentemente vimos reportagens que falam da capacidade de ação dos governos no Japão, na recente crise do tsunami e da usina nuclear. Trabalham, lutam e estão resolvendo os problemas. Olhando para o Brasil, vemos o estado em que estão tantas regiões que muito sofreram com chuvas e inundações e até hoje envergonha saber o quão pouco ou nada foi feito.

O pior disso tudo é que vemos um estado que não tem capacidade de fazer o que é necessário, querendo ser ainda maior e dominar muitos dos ciclos produtivos que são base de funcionamento da nação. Se é incompetente no pouco, como querer ser competente no muito?

O que me espanta no caso brasileiro é que para o governante, para o juiz brasileiro, é importante considerar essa questão, tempo não é variável a ser considerada. O Estado não tem preocupação com o tempo de resposta, os juízes não se importam se os que buscam justiça morrem antes das sentenças. Efeito colateral de um estado incompetente, que acha que tem que ser assim mesmo.Veja-se os casos dos precatórios. Ainda por cima se louvam e se glorificam mutuamente. Medalhas custam caro e é o contribuinte quem paga.

De onde vem essa cultura e esse posicionamento do estado? Essa aceitação da lentidão como algo normal? O estado brasileiro não tem a visão de correr mais depressa do que a sociedade, correr na frente para preparar os caminhos. A visão e a experiência não é de construir riqueza, mas de dominar o que existe. Dominar é o que interessa, não interessa o resultado. Tempo não entra em jogo.

Velocidade e capacidade de ação
É interessante observar que o Brasil vem historicamente evoluindo de ciclos econômicos lentos. Muito lentos. Planta-se café e maçã e se leva x e y anos para colher. É da natureza. Mais tarde, consideramos como eixo da economia ciclo econômico mais lento ainda que foi e é ainda o da construção civil.

Levava-se dois a três anos para construir um prédio, movimenta-se a economia nesse período, mas depois vemos um capital enorme imobilizado para dar emprego apenas para um zelador, um faxineiro e um porteiro. Isso é bom aproveitamento de capital em um pais com restrição de capital?

Questão interessante, a contabilidade no Brasil é marcante como agente caracterizador de ritmos lentos e eficiência produtiva baixa. O que se vê é cada vez mais regrinhas, mais normas, mais exigências, tudo isso por que aceitamos sermos lentos, muito lentos e muito caros.

A contabilidade como recurso de gestão faz com que tudo funcione em cadência mensal em termos de processos de tomada de decisão. Tempo não interessa para a contabilidade. Felizmente, hoje em dia qualquer um sabe que dominar fluxo de caixa é muito mais importante e é o verdadeiro fator de vida da sociedade.

Temos então um diagnóstico interessante a fazer. Somado à incompetência dos governantes, temos a incompetência dos modelos de gestão em vigor, a cultura de que a variável tempo não é importante, tudo pode ficar para depois, estruturas de governo que não têm na velocidade referência de governança. Um absurdo.

Restrição de capital e velocidade
Primeiro temos a considerar a tentativa de nos fazer crer que somos país rico. Somos uma das maiores economias do mundo. Basta visitar nossas escolas, hospitais, estradas, portos e favelas para nos darmos conta da nossa verdadeira situação. Se não somos um país rico, temos então pouco capital para investir e para sustentar o ritmo de nossas atividades. Fato notório.

País pobre, que tem pouco capital precisa de ciclos produtivos rápidos e muita velocidade no trabalho. Aceitar a desindustrialização do Brasil é aceitar conviver sem ciclos econômicos rápidos. Erro estratégico. Tudo começa aqui. O Brasil aceita viver sem ciclos econômicos rápidos e a absoluta maioria dos nossos governantes nem sabe o que é isso e quais são as consequências. Reclamam então do câmbio.



Luiz Bersou