O que era evidenciado por sinais tênues, é hoje em dia uma
tendência marcante. Agrava essa tendência a evidente hesitação dos
investidores. Há um sentimento de não se acreditar mais na indústria do Brasil.
Conversando recentemente com importante industrial de
Ribeirão Preto, ele disse: vou fechar as fábricas, vou ficar somente na
importação e comercialização. Outro industrial de São Paulo tinha 5 fábricas.
Hoje apenas presta assistência técnica aos produtos importados que vende aqui.
Quantas vezes já ouvi essa afirmação? Já perdi a conta. A tendência é muito
forte.
Um efeito perverso é a perda de base tecnológica. Que os
outros estão ganhando. O governo reclama da falta de inovação. Como tratar
dessa questão em um ambiente de perda tecnológica? As questões de base estão
muito abaixo do nível por onde circula o pensamento governamental.
Ciclos econômicos curtos e ciclos econômicos longos
Países pobres como o Brasil, onde há evidente falta de
capital a serviço da sociedade, precisam de ciclos econômicos curtos.
Há no Brasil toda uma história de ciclos econômicos longos.
Exemplo, pecuária, espera-se mais de dois anos para se abater o boi, em muitos
tipos de produção na agricultura, café por exemplo, anos para fazer a primeira
colheita e colheita uma vez por ano. Na construção civil, construímos prédios
que representam um enorme capital imobilizado, que ao longo de sua vida dão
emprego para um zelador, um faxineiro e um porteiro. Aproveitamento social
muito baixo do capital.
Na indústria em particular, vendemos, compramos, produzimos
e entregamos em ciclos de tempo muito mais rápidos. Com frequência em um a dois
meses. A realização do lucro é rápida. São os ciclos econômicos curtos,
demandam menos capital para fazer a operação. Todos os países precisam de
ciclos curtos, em particular os ciclos industriais. Países como o Brasil
precisam ainda mais, dada a já mencionada carência de recursos na sociedade que
trabalha.
Questão característica da indústria, ela dá espaço para a
inovação, para acionar a nossa capacidade de construir coisas. Gera trabalho. Por
consequência, gera emprego. Deveria ser prioridade!
O peso Governo Brasil na indústria brasileira
O governo impõe ao industrial brasileiro cada vez mais
exigências, regras, taxas, impostos, restrições de todo tipo. Algo muito grave,
impõe muita perda de tempo. Transforma o ciclo longo em ciclo lento pelo peso
da burocracia. O industrial brasileiro passa com o pires na mão por “n”burocracias,
cada uma completamente alienada do que exige a outra. Exigências conflitantes
são frequentes.
O “Marco Regulatório” é oscilante e governado por portarias.
Qualquer burocrata de governo cria o empecilho ao desenvolvimento de que mais
gosta, que é aquele da sua especialidade. Não temos o governo como aliado dos
industriais, temos o governo como um bedel infantil que tudo restringe e tudo
proíbe. Há uma visão operacional pequena, não há uma visão estratégica grande.
Se adotarmos o pensamento de que o Raciocínio Estratégico
existe justamente para alinhar e facilitar caminhos em direção a determinados
objetivos, percebemos que tudo o que faz o Governo Brasileiro, é o anti
estratégico. Dificuldades no lugar do relacionamento consistente, estruturado e
positivo.
O mais grave de tudo isso, é que o empresário brasileiro, em
vez de direcionar suas energias para a construção do futuro e desenvolvimento
da sua empresa, que é também o futuro do Brasil, direciona as suas energias
para a complexidade infernal que os governos se encarregam de descarregar nas
suas costas. Que ele aceita!
Não é de se espantar com a constatação frequente que fazemos
atualmente: o número de empresários que apenas esperam uma oportunidade para
vender sua empresa e se livrar desse abacaxi.
Não é assim que se constrói um país.
A média e pequena empresa com conteúdo tecnológico no cenário
competitivo mundial
Sabemos que em todos países as grandes empresas tem seu
papel importante nos mecanismos de força que circulam pela sociedade. São importantes,
mas raramente dão os empregos que a sociedade precisa. Operam com ativos
tecnológicos restritos aos contextos econômicos de seu interesse. O mais
importante, por exemplo, a indústria automobilística não faz um país. É preciso
muito mais.
Construir uma base bem numerosa de empresas médias e
pequenas, com conteúdo tecnológico que contemple uma gama mais completa de
interesses da sociedade, é um raciocínio absolutamente estratégico. Essas
empresas precisam ter massa crítica mínima para fazer a inovação incremental do
seu conteúdo tecnológico.
Muitos países que direcionaram políticas de governo para o
estímulo da média e pequena empresa tiveram grandes ganhos sociais por conta
dessa iniciativa. A riqueza foi produzida e se disseminou. Todos ganharam. Em
particular, ganhou a inovação. É interessante observar que muito do que os
americanos apresentem hoje em dia, tem suas origens em algum pequeno
empreendedor. Lá existe quem o entenda e quem o apoie.
Os recursos disponíveis para oxigenar as médias e pequenas empresas
Tivemos outro dia a oportunidade de navegar pelos portais
que fazem o mapa de recursos disponíveis no mercado interno. O Brasil ao longo
dos anos direcionou muita oferta de recursos para as empresas com propostas de
desenvolvimento de conteúdo tecnológico. Toda essa oferta está em um emaranhado
de exigências sem fim. A burocracia tolhe o valor da proposta inicial.
Cabe aqui uma revisão do Marco Regulatório, de forma que
toda origem de recursos, federais, estaduais e municipais transitem pelas
mesmas regras e exigências. Essa revisão nunca será feita pela burocracia
instalada nos diferentes níveis de governo. É o que justifica a sua existência.
Cabe então um chamado às classes empresariais em suas
diferentes associações.Novos objetivos para essas entidades. Todos os bons
cidadãos têm interesse que a dinâmica do mercado das empresas com conteúdo
tecnológico se desenvolva. Novos negócios, novas tecnologias, novos mercados,
mercados internacionais. Toda grande empresa precisa de outras empresas, médias
e pequenas. Cada um precisa do outro, nessa malha que representa o novo estado
das cadeias de valor, que são os campos de valor.
O posicionamento das entidades financeiras e as empresas
Aqui entra outra questão que precisa ser revista. Pagamos “spreads”
altíssimos. Dos maiores do mundo. Porque eles são tão elevados? Temos que
considerar primeiramente que bancos que tem governos para os quais podem
emprestar muito dinheiro sem riscos, terão sempre como prioridade o governo e
não as necessidades da sociedade.
Somos uma sociedade, onde se incluem os bancos, formalista,
patrimonialista, paternalista e avessa ao negócio, ao risco. Os bancos
emprestam dinheiro para empresas que pouco conhecem, não sabem da exata
qualidade do negócio, da evolução da condição de risco, tudo isso por que
analisam as empresas segundo documentos extremamente formais, que não interpretam
a dinâmica e a alma da empresa. E por que emprestam? Por que o spread resolve
qualquer questão! Por que dedicar tempo a analisar empresas e os seus negócios,
se o spread cobre os meus riscos?
Em particular em relação às entidades de fomento, enquanto
as análises não forem muito mais profundas e consistentes, assumindo dessa
forma spreads muito menores, apenas estaremos fingindo que financiamentos o
crescimento do Brasil. Mais uma vez uma chamada às classes empresariais para
assumirem novos objetivos em suas associações.
As incubadoras – a possibilidade de recuperação da base tecnológica
Já tivemos oportunidade de visitar incubadoras em diversos
países. Também no Brasil. A proposta é a mais nobre possível. A expressão
“incubadora” tem o significado de que alguém cuida de alguém e contribui para a
sua evolução e qualidade de vida.
No Brasil percebemos a enorme distância que existe entre as
empresas incubadas e as entidades que deveriam ter propostas de orientação
tecnológica, estratégica, comercial, operacional e de gestão. Por que
mencionamos enorme distância? A razão é que essas entidades existem mas não
chegam nas empresas. Incubadoras no Brasil tem outro significado. Está muito
mais para um hotel onde as empresas compartilham espaços, na base de cada um
por si, do que uma verdadeira incubadora no sentido lato da palavra.
Aqui mais uma vez renovamos uma proposta já apresentada para
algumas entidades. Por que não se criam mecanismos de apoio às empresas
associadas dentro das próprias associações? Foi com essa visão que entidades
que existem há séculos renovaram as competências profissionais dos seus
participantes. A história conta.
Luiz Bersou