FORMAÇÃO DO
HOMEM
A questão da
qualidade da nossa sociedade e sua capacidade de construir o futuro que
queremos, está cada vez mais merecendo atenção e preocupação de muitos. Existem
aqueles que acham que tudo vai dar certo e aqueles que são mais conservadores e
mostram preocupações por várias razões. Diante desta divergência cabe a
pergunta: Estamos construindo as bases para o futuro que queremos? Que futuro
queremos ? Que bases são estas?
Na Grécia
antiga, a educação era o centro das preocupações da sociedade. O tema “Paidéia”
(Werner Jaeger), conjunto de conceitos ligados à civilização, cultura,
tradição, literatura e educação,buscou a formação de um elevado tipo de Homem.
O Homem Virtuoso. Segundo Heródoto, a idéia da educação representava todo o
sentido do esforço humano.
Para os Gregos,
a educação não era um esforço individual. A tarefa da Educação pertencia por
essência à comunidade, era dever de todos. Cabe aqui uma frase da tradição
chinesa - É preciso toda uma aldeia para educar uma criança. Da educação deve
resultar a consciência viva que rege e direciona os caminhos da sociedade
virtuosa.
A sociedade
virtuosa é aquela que gera os verdadeiros homens, o ser completo. O caminho da
perfeição era e é o caminho da educação. O caminho da perfeição era o da vida de
qualidade em sociedade, vida em comunidade, em família, nestes tempos atuais, vida
em equipe. Vida virtuosa.
O relato
histórico nos conta que os Espartanos foram grandes guerreiros. Sutileza: a
unidade mínima do exercito espartano não era um soldado. Era uma dupla de
soldados. Ataque e defesa. Equipe.
Da virtude vem o
espírito que era designado como o da região da verdade e belezas eternas. Foi nesta
atmosfera que os gregos nos deixaram o seu legado, tão acima das nossas atuais
percepções do que deve ser a vida em sociedade.
A EDUCAÇÃO
Examinando a
raiz latina da palavra educação, verificamos visão de transferir conhecimento,
fazer obedecer, fazer com que aprendam o que o professor sabe. A relação entre
professor e aluno é unívoca, direcionada de cima para baixo.
Analisando as
raízes gregas da palavra educação “διδασκω – didasko”,encontramos as expressões diálogo,
contestação, contextualização, experimentação e revisão. Lendo os grandes
clássicos gregos nos damos conta de como a contestação era valorizada.
Havia uma
relação biunívoca entre mestre e aluno e a visão da experimentação levava ao
enfrentamento da realidade, tal como ela era. Aqui entra uma fala sábia de
Regina Migliori em congresso sobre educação: o melhor lugar para o conflito é a
sala de aula. O grande legado dos professores é ensinar os alunos a exigir e
lutar por princípios e fundamentos.
Deste passado
nos vem a expressão “Talòs”, “estar com os deuses”. Era a preocupação dos
mestres que seus alunos vivessem com os deuses. De “Talòs” nos vieram as
expressões “talento” e “vocação”. Deste legado nos chegam acervos que nos
surpreendem: a visão do “legislador – educador”, questão
impensável no momento atual de nossa sociedade, a visão “educação – honra”,
deixada nos textos de Homero, Platão e Aristóteles, a visão “trabalho
– honra” deixada nos textos de Hesíodo, “medicina – honra”
deixada por Hipócrates e a bravura guerreira expressa nos termos de “astúcia
– prudência”.
Talento e
vocação na relação “trabalho – honra”, mas também talento e vocação na relação “homem – virtude – grupo – sociedade -
equipe”.
Tudo isso é
passado, mas deixou marcas tão profundas que atravessaram milênios. Acho que
sabemos a razão dessa perenidade.
A FORMAÇÃO DA
SOCIEDADE
No caminhar em
direção à visão moderna, em especial no Brasil, veio a dissolução e destruição
das fundações da sociedade virtuosa. Veio então a debilidade, a falta de
segurança e até a impossibilidade de qualquer ação educativa.
De um momento
histórico em que o centro das preocupações da sociedade era a educação, vivemos
a nossa realidade do dia a dia,onde educação não é prioridade. Dita ser
prioridade, na prática brasileira, educação nunca foi prioridade suficiente de nenhum
governo. Visão do político é a de que
educar é perder votos e submissão.
Pior, nesse
momento do Processo Mensalão, percebemos que a busca da construção do Homem
Virtuoso pela educação nem é entendida como algo necessário e bom para
qualquer sociedade.Nem é entendido que na construção do Homem Virtuoso, a
educação representa todo o sentido do esforço humano. Deveria ser este o nosso
grande legado para as gerações que nos sucedem.
Sociedades
focadas na construção do poder, historicamente marginalizaram a educação, pois
querem como cidadãos, carneiros obedientes. Esta condição sempre foi importante
para os que buscam poder.
Uma das questões
terríveis que encontramos aqui é a ideologia como fundamento da educação. É o
que está acontecendo com o Brasil nesse momento. Com a ideologia presente, cessam as
perguntas, vem somente as afirmações. Temos aqui a educação pela busca
da obediência. No passado já foi utilizada a expressão: carne humana como bucha
de canhão. É o que interessa aos que querem poder.
Sociedades
focadas no sucesso econômico não se consolidam na ausência dos fundamentos da
educação como foco estratégico. Sociedades focadas na educação, na gestão do
conhecimento, criam os fundamentos estratégicos que lhes permitem aspirar ao
sucesso econômico. Como no Brasil prevaleceu a busca do poder, não aprendemos ainda
esta lição.
É registro histórico
que o sucesso econômico dos países anglo-saxônicos se deveria ao fato de que a
questão do lucro era algo bem vindo pelas igrejas reformistas, o que não
acontece com as igrejas ligadas ao catolicismo.
Registros mais
recentes nos indicam que uma das bases do sucesso econômico esteve no fato que
a indução da leitura da Bíblia levou os crentes reformistas ao poder do
conhecimento e sua disseminação. Aprender a ler com a Bíblia gerou o sucesso
econômico, não somente a visão de que lucro é bom. Educação gerou então sucesso
econômico.
SOCIEDADE DE
RESULTADOS
Raramente
conhecimento por si só gera resultados. Conhecimento estruturado e
sistematizado pode gerar resultados. Como paliativo à falta do conhecimento,
falta de recursos humanos válidos que possam atender às necessidades das
empresas, aceleramos treinamentos de ordem técnica como questão necessária para
a busca do sucesso econômico. O que se constata é que treinamentos de ordem
técnica não são suficientes para estruturar e sistematizar conhecimento.
A pergunta que
fazemos, recordando a expressão “Talòs”, é: Esses técnicos estarão com os
deuses? Ou serão apenas arremedos dos homens virtuosos, os quais tanta falta
fazem à nossa sociedade. Haverá realmente sucesso econômico? Os homens que
comprarão os nossos produtos serão virtuosos ou apenas pequenos zumbis? Como a
construção do homem virtuoso se propagará dentro de nossa sociedade?
Em vez de
criarmos tecidos sociais convergentes que estruturam sociedades e sucesso
econômico, estamos criando colchas de retalhos que não são convergentes e não
estruturam sociedades. Voltando ao primeiro parágrafo, concluímos que não estamos construindo as bases para o futuro
que queremos.
O que precisamos
fazer em termos de educação o povo grego já fez. Não devemos ter vergonha de
recriar a roda. Pena que estejamos perdendo tanto tempo. Acho que todos aqueles
que lutam pela educação deveriam ler Paidéia. E mudar tudo!
Luiz Bersou