Em artigos anteriores introduzimos a conexão entre condição competitiva e a capacitação para a Entrega. Entendemos Entrega como o principio em que como cidadãos, como sociedade, como integrantes de governo e colaboradores no trabalho cumprimos no tempo e com a qualidade devida tudo o que foi combinado entre as partes.
Entrega é produto de um fundamento social que é a Cultura de Rigor. Dada a importância do tema, vamos entrar mais a fundo na questão, pois a presença ou ausência da Cultura de Rigor realmente afeta a condição competitiva de sociedades e empresas. Questão que se torna a cada dia mais necessária e mais urgente.
O QUE É CULTURA DE RIGOR?
Estamos definindo Cultura de Rigor como um estado e posicionamento coletivo pelo qual as competências e procedimentos são praticados exatamente como estabelecido de acordo com planejamentos estruturados e conhecimentos dominados.
Dentro da cultura do rigor se busca sempre o objetivo final, que é sempre coletivo, a despeito de quantas superações de natureza ética forem necessárias no contexto do coletivo que estiver estabelecido. Cultura de Rigor pressupõe constantemente um estado de luta com o que não foi conseguido. Não há desistência e nem rendição. Temos então o que chamamos de Entrega.
ABORDAGEM
Para efeito de abordagem do tema, vamos apresentar alguns exemplos reais, onde se trata do desconhecido que chega cada vez mais depressa e com mais impacto e como decorrência, tudo muda e de como a falta da Cultura de Rigor desarticulou competências pretensamente estabelecidas, pretensamente satisfatórias.
1. O ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Tivemos recentemente o impacto das chuvas que provocarem deslizamentos que mataram centenas de cidadãos. Fenômeno climático, cadência anual, impactos diversos a cada ano. Relatórios de que sempre houve, em grande número, a manifestação e leitura de sinais fracos em relação ao que poderia acontecer. Apesar dessas leituras, o que aconteceu pegou todo mundo de surpresa.
ANÁLISE DE SITUAÇÃO
Todo ser inteligente sabe que a natureza não reage às agressões da sociedade que ocupa o planeta. Acontece que a natureza tem mostrado constantemente que se vinga. O não previsto chega cada vez mais depressa, existem os sinais fracos que se devidamente interpretados vão dar indício do que vai acontecer e existe a incapacidade de se ler esses sinais fracos.
Todo ano é investido um bom dinheiro nas estruturas de Defesa Civil. Percebe-se que todo o dinheiro foi utilizado apenas para manter em pé uma entidade que tem enormes dificuldades para cumprir o seu papel.Do ponto de vista sociológico, o que temos é um teatro de aparências. Acontece na Defesa Civil e nas nossas empresas também.
As rotinas e as burocracias do dia a dia, em um contexto individual e não coletivo, desviam a atenção do que é crítico, perde-se foco sobre o que é importante e se dá atenção ao que não é importante. Gasta-se dinheiro no que não é importante. Falta para o que é importante.
REFLEXÕES
Por falta de rigor na definição dos objetivos, as entidades de Defesa Civil não estruturaram os mais importante: a análise de risco em profundidade nos territórios com maior potencial de acidentes graves.
Podemos dizer que a questão da falta de rigor está presente desde a concepção do que devem ser estruturas de Defesa Civil, na falta de rigor na definição dos objetivos realmente importantes. Falta de rigor em fundamento importante que é o prognóstico de desastres potenciais. Tudo o que se percebe enfim é um estado de cultura que reflete um tipo de sociedade.A nossa. Já pensaram na Cultura de Rigor dos chineses?
2. EMPRESA QUE PERDE PARTICIPAÇÃO DE MERCADO
Empresa tradicional, presente e todos os estados do Brasil, exportadora, mais de 50 anos de vida, famosa, começa a perder participação de mercado.
ANÁLISE DE SITUAÇÃO
Análise abrangente, todas as variáveis de mercado, produto, produção, qualidade, custos, capital de giro e assim por diante.Mapas de análise. Mapas de problemas. Muitos problemas. Milhares de problemas.
Na verdade, a empresa não tinha muitos problemas. Havia um único problema e causa raiz. Por falta de rigor na definição de objetivos e métricas de análise de desempenho e gestão voltada para o controle de objetivos que não foram fixados, houve uma progressiva deterioração de rituais que deveriam sustentar fundamentos estratégicos e operacionais. Tudo começou com a progressiva falta de rigor que pouco a pouco tomou conta da empresa.
REFLEXÕES
O tempo e a rotina criaram um estado de relaxamento em relação aos rituais necessários à sustentação das empresa. Mais uma vez a questão do rigor está presente.
A percepção do que realmente estava acontecendo, está mudando o curso dos acontecimentos. O diagnóstico levou ao foco de atuação.
3. EMPRESA QUE NÃO CHEGA NOS RESULTADOS NECESSÁRIOS
Empresa tradicional, disputa mercado com grandes multinacionais, presente em todos os estados do Brasil, gera recursos mas não dentro das expectativas do financiamento do crescimento.
A busca do crescimento não foi complementada com os rituais necessários para prover a resposta da máquina operacional aos desafios decorrentes dos objetivos estabelecidos.
A desconexão dos rituais internos e a falta do rigor dos objetivos fez a empresa perder tempo.
REFLEXÕES
Este caso é muito interessante por que é um caso em que as competências estavam estabelecidas, mas a Cultura do Rigor não estava presente. A empresa arca com pelo menos 10 anos de atraso por conta desta situação. Está agora tratando de recuperar o tempo perdido.
A CONSTRUÇÃO DO RIGOR
Quando conversamos com japoneses, noruegueses, finlandeses, russos, ucranianos, canadenses, percebemos que ao longo da história o General Inverno foi um grande moldador do planejamento rigoroso, do rigor nos procedimentos e rigor na qualidade do que é feito. O clima e a história construíram a cultura do rigor.
Percebemos também que em muitas empresas a cultura de rigor se estabelecer pelos objetivos. Objetivos bem estabelecidos, cobrança forte em relação aos objetivos faz sua parte.
É interessante observar neste caso como é o correto e claro estabelecimento do contrato interno entre os colaboradores que leva à construção da cultura do rigor. Esta é uma questão pouco desenvolvida em nossas empresas. Culturalmente fugimos dos contratos claramente estabelecidos. Mecanismos de fuga no acerto do contrato sempre estão presentes e levam à deterioração dos esforços na direção da cultura do rigor.
A CONSTRUÇÃO DA CULTURA DO RIGOR
Já há alguns anos começamos a estudar, desde os momentos do helenismo, a relação entre beleza, estética e rigor.
METRO
O caso do Metro de São Paulo, é algo que merece ser citado. Quando ele estava para ser inaugurado, havia a má expectativa de atos de vandalismo, depredação, pichação nos trens e estações. A decisão que foi tomada: revisão de todas as estações e trens todos os dias, e tudo o que estivesse sido danificado e ficado fora de estética era corrido na mesa madrugada. O resultado, a população respeita o sistema Metro. Ordem, cuidado, limpeza e beleza foram e são a causa raiz.
FABRICAÇÃO DE ÔNIBUS
Entrando no ambiente das empresas temos casos extremamente interessantes. Os banheiros da linha de montagem do maior fabricante de ônibus do mundo são de mármore. São impecáveis. Os próprios operários se encarregam da limpeza. O resultado é o rigor com que os ônibus são montados. Minimização de erros e de custos. Cuidado em tudo. Alto astral em tudo.
CONSTRUÇÃO CIVIL
Na década dos anos 80 estabelecemos elementos de “Clean Production” em projetos de construção civil. Estabelecemos padrões rigorosos de acompanhamento de todos os operários. Tivemos casos de operários que aprenderam a ler pelo enfrentamento diário dos cronogramas. Obras limpas e busca do zero em desperdícios.
O resultado foi a entrega dos prédios antes dos prazos e abaixo do custo orçado. Todos eles estavam entusiasmados com o trabalho por conta da ordem e limpeza dos ambientes.
A CONSTRUÇÃO DA CULTURA DO RIGOR NA FAMÍLIA
Uma evolução que estamos desenvolvendo trabalha elementos de rigor, beleza, estética e limpeza envolvendo não somente os funcionários mas suas esposas e mesmo famílias.
O primeiro caso deste tipo foi em Joinville, Santa Catarina, ano de 1984. A cultura local ajuda, mas o envolvimento das esposas e filhos nas questões de limpeza, estética e rigor mudaram de forma significativa procedimentos de linha de montagem.
Luiz Bersou
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